sexta-feira, 11 de julho de 2008

o homem que lia o jornal de ontem

Quem passasse na Rua da Soledade, na frente da casa 53 pela manhã, com certeza viria dois jornais jogados no tapete da frente. Josefim tinha uns 30 anos, apesar dos cabelos grisalhos.Não saia de casa nem para comprar comida: mensalmente vinha um entregador com uma pequena sacola e deixava na frente de sua casa as comidas de necessidade básica, e por um buraquinho na porta ele passava as mãos magras com o dinheiro. Era de poucas palavras e considerado um 'louco-esquesito' pela vizinhança.

Sua fama vinha pela fato de sempre ler os jornais do dia anterior, passando a noite toda concentrado naquelas notícias deliciosamente atrasadas. Em uma de suas aparições pela rua para apanhar o jornal que o " pirralho-jornaleiro" havia posto longe de seu portão, um garoto lhe abordou:
- Seu Josefim, por que o senhor ler sempre o jornal de ontem?

- Por que você ler o jornal do dia?

- Pra saber as notícias do dia.

- Eu leio o jornal de ontem para saber as notícias de ontem, ora pois!


E entrava sem mais conversa. A cada dia a vizinhança se intrigava mais com os seus mistérios. Ele não tinha telefone, tv ou rádio! Seu único meio de comunicação era o tal jornal ultrapassado. Ele acreditava que as notícias velhas eram mais atraentes, pois podia rir delas, chorar delas ou até mesmo xingá-las e depois ler todas as desgraças, ir dormir tranqüilo. Afinal, as notícias já haviam passado e nada pudia se fazer para mudar. E assim passava seus dias sozinhos ansiando o jornal para pegá-lo um dia depois.

Certa vez, viu no jornal uma notícia de um homem que lia jornais. Surpresa. Ele havia morrido segundo a notícia. Com letras grandes e vermelhas o jornal falava de seu assassinato, quando fora pegar o jornal havia sido abordado por um moleque ladrão e morto pelo mesmo. Inquietou-se.

Sentado em sua poltrona de sempre, pensava no acontecido. Ele havia morrido? Como nunca havia percebido? A vida as vezes nos prega peças e em pleno dia se morre. O jornal caiu de sua mão.Levantou-se, foi até a janela, riu de sua própria vida, uma gargalhada leve de descanço. Foi até o guarda-roupa e pegou a arma, sentou-se na poltrona. A luz vermelha do pôr-do-sol o tentava, lhe mostrando o que fazer. E aos poucos o jornal de ontem no chão era tomado por um líquido da mesma cor do céu, o céu que trazia notícias novas.

6 comentários:

fernanda disse...

como ele mesmo pensava, o bom do jornal do dia anterior era não ter de se comprometer com nada que o momento de mudar já tinha passado.
pois é: passou e ele teve de passar também.

abel disse...

mas se ele havia morrido no dia anterior, como se matou de novo? o.O

uheauheae

gostei do texto, apesar de não ter entendido muito bem... :P

Anônimo disse...

gostei, é bom sempre lembrar que somos nós que nos acomodamos perante os problemas da sociedade, escrever sobre alguém que pode ser um de nós e trazer isso através de uma crônica foi legal.
só acho que poderia dá uma melhoradinha no final, umas coisinhas ficaram meio confusas C:

Ph disse...

Trabalhar com tempo sempre é problemático. É mto difícil. A gente não sabe se é possível mudar o futuro. Se alguém mudou o passado, o passado pra o presente não vai ser outro?
Eu não me preocupo em entender agora. Daqui a uns dias eu entendo. Talvez.

Bruna monteiro disse...

disseram que não se pode viver e entender a vida ao mesmo tempo, talvez isso justifique, mas não explique...

fernanda disse...

Eu n vi problema nenhum com o tempo da história.
me pareceu bem conexo, tendo em vista os jornais de ontem do cara, e tal
além do mais:
VIVA O REALISMO FANTÁSTICO!
;~