quinta-feira, 16 de outubro de 2008

ímpeto

Faz 3 dias que eu não durmo e foi nesse ar de
dormindo-acordada que o fato aconteceu. Eu estava na parada de ônibus, comendo Doritos,
quando começou a tocar uma (não) música alta onde eu
me lembro de ter escutado algo como: " faz assim que
eu gosto, faz assim e eu me enrosco". Sim, era um
brega. E dos piores. Nesse momento, lembrei que levava na bolsa a minha
salvação: meu MP4. Salve, salve os fones de ouvido,
me livrando do resto do mundo. Salve, salve Placebo,
que começou a tocar nos meus ouvidos.
*
Sentei perto da janela, o vento no meu rosto trazia
uma sensação de leveza e compreensão. Me senti
protegida, sabe? Há coisas que sentimos, sabemos que
está lá, mas não há palavras para descrevê-las, e nem
precisa.
*
Quando eu fico com sono, meus olhos ficam apertados
querendo fechar, assim, os postes passavam rápido
parecendo estrelas, e os faróis dos carros dançavam
formando constelações. Se você quiser,pode tentar, é
só apertar os olhos e ver uma lâmpada, a estrela
estará lá, esperando você a notar.
*
Os passos dados, não eram passos, pois eu não pisava
nada. Eu tinha asas, e isso não era tudo. As
guitarras ainda tocavam, o salgado na boca me
mostrava a razão, descendo pela faringe, sendo
empurrado pelo esôfago, sendo meticulosamente
mergulhado num ácido e digerido no estômago. E a luz,
a luz me dizia o que eu queria ouvir. Transcedi,
transfigurei, enterneci. Senti um alegria efêmera,
que eu ia me afogando lentamente. Como essas pequenas
coisas me fizeram me sentir tão bem? Por que nunca
havia a sentido antes?
*
Esqueci das provas, dos fins, das viagens, das
saudades. Esqueci até mesmo de Jobim e da festa que
eu iria ter no sábado. Vivi apenas o instante. O
instante onde as estrelas era tocáveis, estavam tão
perto que quase cegava, tudo se derretia. Não havia
desespero, medo, amor, futuro. Havia apenas o
instante: belo, intenso, finito.
*
A bateria do meu MP4 acabou, as guitarras, mudas,
se partiram em pedaços empoeirados, o salgado na boca
incomodava. E a luz, a luz me dizia que o devia ser
dito. Quanto mais tempo dura a ilusão, maior é o
baque ao ver a verdade. Crua, simples. Cadê as
guitarras? O salgadinho acabou. Os olhos
lacrimejavam, a realidade é dura demais para ser
mostrada, assim, sem nenhuma preparação. Sinto que
foi até uma covardia ela aparecer assim.
*
A noite é um véu escuro que nos protege do real, ela
é profunda, sincera. No amanhecer, ele começa a ser
retirado e o vermelho que se faz no céu já anuncia:
perigo. Por instantes o sol tenta nos cegar até que o
véu, com pena dos humanos, é posto novamente, para
eles descansarem do seu fardo: viver. Mas o que isso tudo realmente importa?

Prefiro minhas estrelas artificiais.

4 comentários:

DER KOSMONAUT disse...

Quando eu faço isso contra a luz, meus olhos doem. É lindo, parece uma foto em que a luz estoura, mas dói.

Eu ainda prefiro a saudável mistura das duas.

"Cansei dessa realidade
Em que tudo entra pelo cano
Eu quero viver de verdade,
eu fico com o cinema americano"

Unknown disse...

É, mesmo se não houvesse "Postado por Bruna Monteiro às 18:00" saberia que é tudo, tudo teu.

Ph disse...

Será que viver é um fardo?

fernanda disse...

É! Dá pra saber que foi bruna quem escreveu antes mesmo de terminar o texto :P

Mas a realidade é necessária pro devaneio, também. Sem ela que sentido teria fantasiar, fugir? - fugir de quê?

Eu gosto é da vertigem que dá quando se mergulha e emerge em realidades diferentes. Eu quero viver na loucura da dicotomia, do paradoxo.