quarta-feira, 31 de dezembro de 2008

todo o sentimento


E que venha 2009, cheio de risos, choros, saudades, estresses, vestibular, abraços, viagens, risos, choros e saudades.

Não vou falar de 2008, foi um ano deveras chato e comprido, tão comprido que teve 366 dias. ô cara implicante. Só falo de 2009, e que venha 2009, e que venha essa saudade.


toda a felicidade.

terça-feira, 23 de dezembro de 2008

E meus dias não são mais que pó. Cinza das tuas piores horas, eu te passo e repasso em minha mente: onde estão as surpresas antigas? Foi você quem as matou. E agora, o que há para mim? Senão o tempo inesgotável, em que a torneira pinga lenta e ininterruptamente, na cozinha, nos banheiros, nos quartos, na sala. Na minha mente, não há mais nada. só o vazio, o eco dos teus passo, indo embora. Eternamente.

domingo, 14 de dezembro de 2008

INUSITADO


Estava no carro, pela janela passavam quadros repetidos de plantações enormes e monocoloridas. E de repente, da monotonia fez-se encanto: ao som de vanessa da mata, todas começaram a dançar com o vento em festejo a vida.


sexta-feira, 12 de dezembro de 2008

descobertas matinais.


Eu não sei o que é o amor, sim, eu uso essa palavra, talvez eu a tenha a sentido, como poderei saber? Eu uso esta palavra por não haver outra melhor que explique essa imensidão que emana dos olhos, que se esconde no peito. Mas, às vezes, eu sinto que o que corre na minhas veias é muito, muito maior que o amor, mesmo sem saber ao certo o que é, mesmo sabendo que é tanto.

domingo, 7 de dezembro de 2008


a questão é: todos querem a paz, mas quando tiverem o que vão fazer com ela? A paz só vai exisitir quando tiver alguma coisa errada. Por exemplo, se um casal de namorado se dá muito bem, sempre que um fala, o outro aceita, SEMPRE: um vai tá sendo canalha de mandar demais, e outro está sendo canalha por se fazer de coitadinho e aceitar demais. A discussão faz parte do mundo, e o mundo em paz seria EXTREMAMENTE monótono. A discussão faz parte do homem, mas a guerra só dos irracionais.

30-09-06

quinta-feira, 4 de dezembro de 2008

conversa de msn.



Abaquar - Matuto do Alémar diz:
vc é que tem que sabe o que vc quer e fazer por onde
Abaquar - Matuto do Alémar diz:
num importa para mim o que vc quer
Abaquar - Matuto do Alémar diz:
desde que vc se dedique e busque e construa algo para vc
Abaquar - Matuto do Alémar diz:
e isso é sobre a vida, meu bem
Abaquar - Matuto do Alémar diz:
sobre tudo
Abaquar - Matuto do Alémar diz:
se faça alguma coisa faça de verdade
Abaquar - Matuto do Alémar diz:
é melhor fazer as coisas de verdade pq as coisas que vc faz levando com a barriga vez ou outra vai desmoronar pq naum tem base
Abaquar - Matuto do Alémar diz:
sabe?
bruna diz:
mas e se tudo for uma ilusão?
bruna diz:
voce achar que é verdade, se doar
bruna diz:
e cair?
Abaquar - Matuto do Alémar diz:
vc nunca pode se dar por inteiro, pq vc só pode dar o que vc tem... vc acha que se conhece por inteira para se doar por inteira?
_
é que a tecnologia é assim, faz do distante: perto. E como as palavras chegam longe, esses conjuntos de letras formando frases atravessaram o atlântico e chegaram aqui, iluminando tudo.

sinto tanto tua falta, irmão.

segunda-feira, 1 de dezembro de 2008

mudança no script


Naqueles olhos de piscina cristalizado, vidrado, parado, ele ainda pode ver a alma acolhedora que partira. No peito dela uma flor vermelha, com o centro um ponto pequeno preto metálico, ia se abrindo. Enquanto o corpo avermelhava por fora, empalidecia por dentro. Ele, com os olhos fundos e sem lágrimas, era paralisado pelo sentimento que lhe invadia, uma dor imensa que só quem realmente ama sabe o que significa. Enquanto o corpo empalidecia por fora, avermelhada por dentro.

A partir daquele dia, não haveria mais dia para ela, não haveria mais sentido para ele. Enquanto a morte lhe molhava tentando lhe dizer: " Levante-se, sua história não acaba aqui!" O líquido amarelado na garganta descia queimando. "Da minha história só sei eu!" E a cada cerveja tomada ele ficava mais sóbrio, mais sério.

O céu estava tão cheio de estrelas como ele nunca havia visto, ou seria seus olhos embaçados que via as luzes dos prédios, carros e postes pequenas lá da cobertura? Lá só o vento lhe dava os conselhos certos e em súbita conversa muda as palavras soavam só: " O que te prende aqui? O que te faz continuar?". Daria um passo a frente, para eternidade. Não podia esperar mais... E que não esperasse!

Naqueles olhos de piscina cristalizado, vidrado, mas não parado, ele ainda pode ver a alma acolhedora que não partira. No peito dela a flor já secara. E outra flor se formava lá embaixo ao redor de um corpo sem valor, e ao redor dele, vários corpos anônimos se amontoavam para ver o fim do espetáculo. Atrasados, não viram a apresentação toda, mas suas caras de espanto demostravam que se vissem a história inteira teriam gostado.
- Tão novo o rapaz...
- Por que tal desventura?
- Coitados da família!
- Que azar...
- Morreu de quê?
- Dizem que morreu de amor.

domingo, 30 de novembro de 2008

Kaiak Ventura




E em uma manhã qualquer ela decidiu. Sim, havia decidido há tempos, mas, ah, como ela era covarde! Tentaria convencê-lo da sua decisão, mas não era convincente ou talvez ele fosse teimoso demais. " Você não me liga, não vem me ver mais, você acha que realmente me ama?" E a resposta dele era sempre a mesma: Sim.Incondicionalmente. Porém ela não desistia, reclamava de cada ato dele e odiava, principalmente, aquele perfume que, por mais que ela falasse, ele nunca deixava de usar. Kaiak ventura. Foi por esse perfume que ela se apaixonou, e por ele que ela agora sentia mal-estar.

Se conheceram numa festa, coisa normal, como todos os casais comuns. Logo namoraram, riram, choraram, cresceram, foram ao cinema de mãos dadas, e, como toda história de amor, estavam chegando ao fim. Marcaram para se ver na sorveteria, às 14h. Ele estava decidido, ela confusa. Ela era um pouco impulsiva e colocava a culpa no horóscopo. Queria ser rápida e direta. Ela abriu a boca pra falar, mas, ah, como ela era covarde! Se calou, chorou. Ele a abraçou. E, como sempre, disse: sim? Não, não dessa vez. Não sei se foi porque a tarde estava com cheiro de morango ou por que o sol brilhava forte, mas o fato foi que pela primeira vez ele não fez como sempre. De tanto ela tentar o convencer que ele não a amava mais, ela conseguiu. " Você estava certa: isso não é amor. Você teve muita paciência comigo, obrigado. E desculpa ter atrapalhado a sua vida." As lágrimas cessaram.

Às vezes, é preciso tropeçar para saber onde está o seu alicerce. Às vezes, o passado é uma lembrança tão linda que seria um erro confudi-lo com o presente ou futuro, e o mais sensato é guardá-lo. Às vezes, somente às vezes, o sempre nem sempre é sempre e a surpresa nos bate na porta, e não estávamos a esperando, paralisamos. Poderia ter falado algo? Poderia ter sido diferente?

Ela foi andando para casa pensando naquele rapaz de olhos de vagalume, tão encantador. Teria sido o contidiano que a cegou ou teria sido aquele cappuccino? Talvez ela tenha se arrependido, talvez ela tenha ficado tranqüila. O que se sabe é que até hoje ela treme ao sentir o cheiro do kaiak ventura.

sábado, 29 de novembro de 2008

caê-em-canto

" Lembro com muito gosto o modo como ela se referia a ele. Pelo menos ela o fez uma vez e isso ficou marcado muito fundo, dizendo: caetano, venha ver o preto que você gosta. Isso de dizer o preto, sorrindo ternamente como ela o fazia, o fez, tinha, teve, tem, um sabor esquisito, que intensificava o encanto da arte e da personalidade do moço no vídeo.

Era como se se somasse àquilo que eu via e ouvia, uma outra graça, ou como se a confirmação da realidade daquela pessoa, dando-se assim na forma de uma benção, adensasse sua beleza.

Eu sentia a alegria por Gil existir, por ele ser preto, por ele ser ele, e por minha mãe saudar tudo isso de forma tão direta e tão transcendente. Era evidentemente um grande acontecimento a aparição dessa pessoa, e minha mãe festejava comigo a descoberta." do livro "Verdade Tropical" de Caetano Veloso



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caê sempre encantando.

segunda-feira, 24 de novembro de 2008

" SOBRE ESCREVER

Às vezes tenho a impressão de que escrevo por simples curiosidade intensa. É que, ao escrever, eu me dou as mais inesperadas surpresas. É na hora de escrever que muitas vezes fico consciente de coisas, das quais sendo inconsciente, eu antes não sabia que sabia. "

C.L.

sábado, 22 de novembro de 2008

o que francisco me causa.

É um livro e um blog. Para Francisco, (http://www.parafrancisco.blogspot.com/). Francisco nasce dois meses após a morte súbita do pai, e a mãe cria o blog para desabafar e manter a imagem de Gui, o pai, viva para o filho.

“Que absurdo as coisas durarem mais do que as pessoas”.
É difícil manter as pernas firmes, quando a realidade nos aparece tão clara. Tudo é tão vivo. Como pode simplesmente não existir mais?
E é tudo, tudo verdade. Engraçado como nossa vida é apenas uma história qualquer pra quem olha de fora. Se a gente contar, as pessoas pensam que é ficção.


- e assim fico pensando o que é isso que sinto no meu peito, que é tanto que nem cabe, mas que não consigo passar completamente.

_

desculpe, eu precisava mudar esse blog, ele estava muito pálido.
é preciso de cor, é preciso de sangue, é preciso amor.

_

Luz, LUz, LUZ , L U C A S, obrigada por ter me mostrado esse blog, obrigada por fazer parte da minha vida.

segunda-feira, 20 de outubro de 2008

Sinopse

Perdida no paraíso proibido do amor vivia só, o amor para ela era um segredo guardado. Nunca havia beijado, não de verdade, sem nenhum acordo comercial implícito, seu primeiro beijo foi um carrasco ladrão, perdeu-se a virgindade, o espírito e a salvação.
Por muito tempo tentou viver acompanhada, achava em Carolina sua fiel amiga, até que esta a traiu. E o rubro sangue teve que ser derramado, em pleno dia, ninguém se preocupou, pois, naqueles tempos, nem o governo tinha isso na lista de suas prioridades. Elisa era má, mas não perversa, não ela louca, mas a normalidade passava longe de sua personalidade, no nascer foi amada. No crescer, foi linda por muito tempo, e então morreu. E passou a viver vagando rancorosa com sigo e com Deus para sempre.
Talvez esse fosse seu erro, se esquecer de Elisa, viver só, tendo como objetivo de sua existência assassinar todos aqueles que não agradassem Fonseca. Seu amante abstrato, seu irmão magoado, sua sombra peregrina, seu maior amor-medo. Elisa lutou contra Fonseca, resistiu, mas era fraca, sempre foi, deixou... ele a tomou, escondeu-a dentro de uma casca, mudou sua alma e a fez esquecer de tudo o que tinha aprendido. Elisa ficou nua, e Fonseca a vestiu de trapos velhos e sujos, que a velha Elisa lavava toda manhã. Mas a tarde vinha e Fonseca a tomava e seguiam - se noites de sono e melancolia, em que o espírito da menina moia-se nos muros, nas cidades, nas tabernas...
todos se conformaram com a simplória e alva feição, os cabelos castanhos e os olhos sem expressão, que nada diziam e tudo falavam.

quinta-feira, 16 de outubro de 2008

ímpeto

Faz 3 dias que eu não durmo e foi nesse ar de
dormindo-acordada que o fato aconteceu. Eu estava na parada de ônibus, comendo Doritos,
quando começou a tocar uma (não) música alta onde eu
me lembro de ter escutado algo como: " faz assim que
eu gosto, faz assim e eu me enrosco". Sim, era um
brega. E dos piores. Nesse momento, lembrei que levava na bolsa a minha
salvação: meu MP4. Salve, salve os fones de ouvido,
me livrando do resto do mundo. Salve, salve Placebo,
que começou a tocar nos meus ouvidos.
*
Sentei perto da janela, o vento no meu rosto trazia
uma sensação de leveza e compreensão. Me senti
protegida, sabe? Há coisas que sentimos, sabemos que
está lá, mas não há palavras para descrevê-las, e nem
precisa.
*
Quando eu fico com sono, meus olhos ficam apertados
querendo fechar, assim, os postes passavam rápido
parecendo estrelas, e os faróis dos carros dançavam
formando constelações. Se você quiser,pode tentar, é
só apertar os olhos e ver uma lâmpada, a estrela
estará lá, esperando você a notar.
*
Os passos dados, não eram passos, pois eu não pisava
nada. Eu tinha asas, e isso não era tudo. As
guitarras ainda tocavam, o salgado na boca me
mostrava a razão, descendo pela faringe, sendo
empurrado pelo esôfago, sendo meticulosamente
mergulhado num ácido e digerido no estômago. E a luz,
a luz me dizia o que eu queria ouvir. Transcedi,
transfigurei, enterneci. Senti um alegria efêmera,
que eu ia me afogando lentamente. Como essas pequenas
coisas me fizeram me sentir tão bem? Por que nunca
havia a sentido antes?
*
Esqueci das provas, dos fins, das viagens, das
saudades. Esqueci até mesmo de Jobim e da festa que
eu iria ter no sábado. Vivi apenas o instante. O
instante onde as estrelas era tocáveis, estavam tão
perto que quase cegava, tudo se derretia. Não havia
desespero, medo, amor, futuro. Havia apenas o
instante: belo, intenso, finito.
*
A bateria do meu MP4 acabou, as guitarras, mudas,
se partiram em pedaços empoeirados, o salgado na boca
incomodava. E a luz, a luz me dizia que o devia ser
dito. Quanto mais tempo dura a ilusão, maior é o
baque ao ver a verdade. Crua, simples. Cadê as
guitarras? O salgadinho acabou. Os olhos
lacrimejavam, a realidade é dura demais para ser
mostrada, assim, sem nenhuma preparação. Sinto que
foi até uma covardia ela aparecer assim.
*
A noite é um véu escuro que nos protege do real, ela
é profunda, sincera. No amanhecer, ele começa a ser
retirado e o vermelho que se faz no céu já anuncia:
perigo. Por instantes o sol tenta nos cegar até que o
véu, com pena dos humanos, é posto novamente, para
eles descansarem do seu fardo: viver. Mas o que isso tudo realmente importa?

Prefiro minhas estrelas artificiais.

terça-feira, 7 de outubro de 2008

NÃO
Me é
dado saber quando ou como,
Poucos souberam e eu sei.
Mas apesar da contramão do entre tanto
Por ventura e porém,

Fez-se. E fez.

.cronos. e ...Theos...

No transe profundo por séculos
dormimos conscientemente,
amando e temendo
um quase tudo
que criaram OS ESPERTOS
que podiam.
(e puderam)

Num ponto de nós mesmos,
superfície do abismo de luz e ignorância,
inocência e humanidade,
fomos nos tornando estrelas pequeninas,
explodindo em esplendor e segurança

ou caminhando com um pássaro roubado
que nos escondeu na realidade sem rumo.

E
contamos, sem um mínimo de sabor,
cada detalhe de incerteza ou veracidade,
ficando
acompanhados
do riso
sem dentes
e alegria
de gritos.

quarta-feira, 24 de setembro de 2008

O azul na película

Tânia entrou no estúdio sorrindo, tranqüila, os saltos ecoando pela sala acústica. Havia qualquer coisa nos seus ares que a distanciava daqueles objetos todos à sua volta. Ela talvez não fosse mais dali. Os olhos sorriam por baixo dos óculos escuros. E vasculhavam. À procura de quê?, era a pergunta que vinha flutuando do outro lado da sala, mas ia ficar mesmo sem resposta, ela agora era a mulher das roupas escuras, do sorriso tranqüilo por baixo da maquiagem e dos cabelos bem amarrados.


— Estava com medo de atrapalhar, mas você não está fazendo nada mesmo.


Ela não o olhava: ele não estava mais ali? Não. Ela que tinha saído, afastara-se a alma e a despedida do corpo era tão insuficiente, chegava a lhe ser desrespeitosa. Quem era aquele mulher que lhe aparecia sem mostrar a expressão, que não o encarava e que sorria aquele sorriso estúpido, sem qualquer sentimento? Não era a mesma de antes, das noites de trabalho, da garrafa térmica cheia de café, a mulher que lhe escondia os cigarros e que enchia as garrafas de gim com chá.


Manteve os olhos baixos, ainda deviam estar vermelhos, e não ousou falar alto, algumas coisas precisavam ser sussurradas, pra que fosse possível fingir que nunca foram ditas.


— Você não atrapalha.


As duas eram diferentes, ele sabia. Muito, muito diferentes. Ele, mesmo, reagia diferente a cada uma. Mas estava ali o problema: qual encanto o prendia tão firme às duas?


— Você voltou mais cedo.


— É... tinha umas coisas pendentes por aqui. Além disso, eu estava curiosa.


Tânia sorria para as fotografias que apanhava de cima da mesa. Lá estava aquela menina, a mesma de sempre: jovial, bonitinha, sorrindo largo, sorrindo muito riso. Tem coisa que precisa se imprimir numa fotografia. Tem coisa que precisa ser eternizada, pra que depois a gente entenda.


— Você revelou quando? — e não levantou os olhos de novo: o céu era maravilhosamente azul, azul pra se derramar os olhos, a alma, o corpo, as memórias todas dentro da película.


Mas ele agora a encarava. De que cor estavam seus olhos? Ela não ia ver. Ele a encarava, quase trêmulo: um clímax segurado por tempo demais entre as mãos. Agora estava todo ferido: a carne, o corpo exposto. Tudo quanto era alma se lacerando lentamente. E ela trazia o corpo aberto e a alma fechada, nunca pudera ser tão inatingível.


— Hoje de manhã — a voz escapava, soprando-se para fora.


Quis se virar, abaixar a cabeça, sair correndo dali. Não queria olhá-la, queria sentir repulsa, queria lhe dizer para não voltar. O nó na garganta lhe confirmava dolorosamente que não era mais preciso.


— Você quer? Eu fiz duas cópias.


Ela ria, agora: tirara os óculos, o encarava de frente. Era o riso de antes?, ele procurava, sentindo o desespero daquele tempo todo aflorar. Precisava ser, tinha de ser. E se fosse? Não havia mais ninguém ali para ele: então não tinham ido os dois embora? quando?

Mas ela só sorria, tranqüila.


— Não, Roberto: o céu não era tão azul.

segunda-feira, 28 de julho de 2008

Aguàrdeste ou O Sapato

Todos choram.

Velório. As velas choram cera até o pires. 14 anônimos se reúnem ao redor do caixão, sete na esquerda, sete na direita, Julio de mãos com Joana num canto. Niscia atrás do morto no centro. A única cor é a cor do luto. Som das preces, soluço de lágrimas, rubro das paredes.

Niscia não reza e seu véu apenas esboça um rosto, a cabeça pende com vagar para baixo, tudo que há nela é pesado. Sua mão sai do roçar com o negro de seu luto para o encontro com a madeira que guarda o corpo. Seu punho fecha-se enquanto imprime tanta força quanto pode. Súbito pára – censuram seu gesto.

Seu olhar congela nas pálpebras de seu marido.

- Antônio... - Niscia não suporta aqueles olhos e fecha os próprios para não ver.

-x-x-x-

Abre os olhos e vê a sala vazia, exceto pelo caixão e outra mulher. A outra fica defronte Niscia, Antonio entre ambas.

- Meus pêsames...
- Meus pêsames...

Mesmo frente a frente, não ousam se olhar. A outra também veste luto, mas calça sapatos vermelhos, escandalosamente vermelhos.

- Niscia...
- Não.

-x-x-x-

Na sala ao lado 17 pessoas vivas desvendam um morto acompanhadas de café e bolachas.

- Meus pêsames...
- Meus pêsames...

- Meus pêsames...
- Meus pêsames...
- Meus pêsames...

- Meus pêsames...
- Meus pêsames...

- Meus pêsames...
- Meus pêsames...

- (café pelando)

- (...)

- (bolacha mastigada)

- Uma tragédia...
- Sem dúvida...

- Iríamos sair este sábado...
- Estava tudo bem com ele quando nos despedimos na sexta...
- Como uma coisa dessas acontece?

- Era um homem bom...
- Pai de família...

- Seu filho sempre foi como um irmão para mim...
- E você como um irmão para ele...
- (terminando a bolacha) também sinto muito pelo seu filho...

- Quer passear Julio?
- (estende a mão)

- Mãe e filho desamparadas...
- (café) é muito injusto...

- Um homem tão equilibrado...
- Talvez fosse promovido para o mês (mais café)...
- Amava tanto o filho...

- Trabalhava muito...
- Gentil com todos...

- Se houver algo que eu possa fazer pela família...
- Fique próximo, pelo menos por hora...
- Estas horas são sempre difíceis...

(bolacha)

(ainda café)

(bolacha)

(café)

(bolacha)

(bolacha)

(café)

- Ainda desse jeito...
- Suicídio...

- De uma hora para outra...
- Volta para casa do trabalho e...
- Não explica...

- Pagava o dízimo...
- Era praticamente fiel...

- Ele disse algo à Niscia?
- Não sei como perguntar isso a ela...
- Ela está péssima...
- Julio também, quanta tristeza...

(bolacha)

- Eu lembro de uma vez, na adolescência, quando ele...
- (café)

- Jogávamos cartas aos sábados...
- O conheci no escritório...
- Faz tempo...

- A mãe dele é uma santa...
- Toda a comunidade irá apoiá-los...

- (...)
- Não acredito que ele se matou...
- (...)
- (café)

Julio está quieto na quina entre duas paredes, vive seu vazio em paz.

Quatro homens vão para uma sala mais privada fumar os cigarros de Antonio e dividir as antigas garrafas de cachaça que ele guardara – beber o morto até a última gota de aguardente, fumar o corpo até a última cinza de fumo.

-x-x-x-

É noite aberta, não há nuvens, não há quase luz na rua, não há lua. Apenas estrelas, muitas, muito mais que o normal.

Em cima do telhado Antonio ofega enquanto observa tudo isso.

- Todo nó ata e divide...
- Todo nó ata e divide...
- Todo nó ata e divide...
- Todo nó.

Sua respiração cessa, ele fecha os olhos, pende seu corpo para fora do telhado como um pêndulo e cai.

-x-x-x-

Todos choram.

Três beatas, entre elas D. Joana ajuntam-se em torno de Niscia com rosários. Homens retiram os móveis da sala.

Com a sala vazia as mulheres se dirigem para a copa, estendem uma toalha, dispõe candelabros, talheres, louça e prataria. Ascendem as velas e servem a mesa com café e bolachas. O som é o assovio das velas, o silvo da chaleira e o tilintar da prataria e da louça.

Posta a mesa elas tornam a sala, a decoram com coroas de crisântemos e mandacarus vermelhos, revoltosamente vermelhos.

-x-x-x-

Abre a porta, Julio entra na sala onde está seu pai, sua mãe e a outra, ele dá a mão à mãe.

- Ele não volta, não é?

- Não filho, não volta.

- É bom para onde ele foi?

- Não sei.

O olhar de Niscia atravessa a outra.

-x-x-x-

Toca a campainha e Niscia atende. A outra está na soleira da porta, assim que esta vê Niscia diz:

- Há dois anos que seu marido divide o amor dele entre nós, achei que você deveria saber. Ele não saberia como contar. Não vim para brigar, não me importo em dividir. Soube que Julio fez aniversário semana passada, parabéns, deve ser um lindo garoto.

Niscia foi incapaz de reagir. Assim que terminou a outra deu as costas e foi embora.

-x-x-x-

A outra foi incapaz de sustentar o olhar de Niscia, abaixou seus olhos e fixou-os em Antônio.

- Com licença... - Niscia soltou a mão do filho e saiu da sala.

Ao chegar ao banheiro ela abriu a torneira para escutar a água. Retirou o véu e cravou os olhos no espelho. Não podendo fazer mais nada, retirou o vestido do corpo, o espelho da parede e sentou-se no sanitário com o espelho nas mãos. Melhor, com o espelho nas luvas porque as luvas ela não tirou, não poderia.

Viu seu desconfortável corpo nu e contorcido sentado no sanitário, achou-se feia. Travou-se no reflexo dos olhos até ver neles Antonio.

Urinava, muito, descontroladamente; Não dava conta disso.

Assim que sentiu completamente vazia limpou-se, pendurou o espelho e fechou a torneira.

-x-x-x-

- Você era amiga do papai?

- Eu era.

- Você sente falta dele?

- Você sente?

- Muita.

A outra encara os sapatos vermelhos sob o véu, constrangida com aquele garoto, aquela forma viva que ela sempre soubera que existia e sempre ignorou. Agora ele era mais Antonio para ela; qualquer coisa que fosse dele, sua mulher, seu filho, sua casa, sua bebida, seu pó, seu resto. Tudo aquilo era Antonio para ela.

-x-x-x-

Rute viu Antonio na platéia, reparou que durante todo o espetáculo ele não pôde tirar os olhos dela. Isso ocorria com freqüência, mas esta fora uma das poucas em que isso a interessara.

No fim do espetáculo ela pediu ao produtor que o chamasse para o camarim, que dissesse que alguém do elenco gostaria de conhecê-lo.

Rute estava terminando de se trocar quando Antonio entrou.

- Quer me conhecer?

- Não, o produtor disse que você queria.

- Ele disse isso porque achei que você quisesse.

- Por que você achou que...

- O que você lembra do espetáculo?

- Quase tudo, ótima estória...

- Que personagem o velho fazia?

- Eu... Não lembro.

- Por isso... Está bem. Se você não quer me conhecer pode ir embora então.

Antonio voltou-se para a porta, mas hesitou. Olhou Rute:

- Suponha que eu queira te conhecer...

- No sentido bíblico?

Desde aquele dia, sempre que Rute estava em cartaz, Antonio dividia seu amor entre a esposa e a atriz.

-x-x-x-

Niscia entra na sala seguida por Joana - mãe de Antônio - e duas beatas. Niscia permanece no mesmo silêncio de outrora, agora mais vazia que antes, as três se impõem na força de seu rosário.

- Niscia...
- Não.

A outra não se pode mais conter, pende a cabeça e em silêncio sai da sala.

Niscia retoma sua posição enquanto as beatas postam-se atrás dela, mais forte a oração.

- Meus pêsames...
- Meus pêsames...
- Meus pêsames minha nora.

- Meus pêsames. Meus pêsames Joana.

- A comunidade toda irá ajudar...
- Sua família não ficará desamparada...
- Providenciaremos advogados para os bens...
- Tutores e empregadas para ajudar com Julio...
- De confiança...
- De confiança...

- Obrigada por tudo. A ajuda é bem vinda, agora se me dão licença gostaria de falar com Joana a sós.

- Claro...
- Claro...

Sem perder a compostura, ambas saíram entre ofendidas e curiosas, como é de praxe entre as beatas.

- Existe algo a se fazer por você minha filha?

- Não. Existe algo que eu possa fazer pela senhora, minha sogra?

- Não.

O silêncio corta o ar e dança entre as velas e o silêncio do morto, tão grande que faz qualquer outro silêncio barulhento, insuportável mesmo.

Joana aproxima-se muito do filho. Murmura:

- Que seja bom onde você estiver, que sentirei falta todos os dias, que Deus lhe proverá tudo que...

- Ele tinha segredos com a senhora?

Joana não entende a pergunta.

- Eu não cobrava explicações.

- E se ele te prometesse algo que não fosse capaz de cumprir?

- Quando ele tinha nove ele me jurou de pés juntos que rezaria o terço comigo toda novena, não agüentou nem dois dias.

- Você recordou-o da promessa?

- Não, eu sou mãe, eu perdoei.

-x-x-x-

- Não durma comigo hoje.

- Perdão Niscia, eu gostaria que meu coração fosse menor, mas ele é grande, grande para dois, grande para três, grande para mais.

Os lençóis são azuis e lilás, a noite que entra da janela é a única fonte de luz.

- Eu não basto? Não sou suficiente?

Os vultos formados por ambos criam geometrias que ora se amam e ora se cortam.

- Ela cavou um espaço em mim que não existia e este espaço é dela, eu não falto para você.

Julio dorme no quarto ao lado um sono profundo, cheio de sonhos.

- O que ela tem de especial?

- No teatro, como ela brilha no palco! Ela no palco é como você com Julio... puro.

Rute se maquiava, as cortinas abririam em cinco minutos, algo nela já dizia que se Antonio aparecesse, seria apenas depois do espetáculo.

- Quando você a conheceu?

- Ela sabia como isso estava me afetando, eu não quero segredos, mas não sabia dizer, então ela tirou este fardo de mim. Eu amo ambas Niscia.

É noite aberta, não há nuvens, não há quase luz na rua, não há lua. Apenas estrelas, muitas, muito mais que o normal.

Antonio não deseja ver Rute antes de juntar Niscia, então fuma. A fumaça clareia o que há dentro e esconde o que há fora, a fumaça não vem mais do cigarro, a fumaça brota direto de Antonio para Antonio. Aguàrdendo, ele anda no escritório pela noite.

Já é quase meia noite, o único que dorme é Julio; Niscia é uma pedra em sua cama – sonâmbula, congelada – Rute põe e tira a maquiagem no camarim horas depois do fim do espetáculo já certa que não verá Antonio esta noite; Antonio consome a própria vontade até que se rasgue na única certeza: não pode viver. Precisa juntar Rute e Niscia.

Depois de tragar a última gota de fumaça e beber a última cinza de aguardente a decisão se anuncia.

Os grilos são a orquestra, Antonio sobe o telhado, encara a noite, ofega e declama:

- Todo nó ata e divide...

-x-x-x-

Todos choram.

Estende-se um tripé no centro da sala, ascendem-se velas em torno do tripé. As três senhoras procedem seu rosário mais baixo enquanto Niscia se retira. Tratam de abrir a casa, cada porta, cada janela, cada portão, tudo é destrancado.

Noutro cômodo mais escuro, um homem morto, nu.

A mão de Niscia escorre o peito do homem e ela tenta fechar os dedos por sobre seu tórax, com força, com unha.

Lacuna. Gilete.

A barba estava por fazer, cuidadosamente ela passou a lâmina, aparou os cabelos desgrenhados e vestiu o paletó - como se fosse vivo.

Niscia entra novamente seguida por quatro homens, eles carregam um caixão que é posto em cima do tripé, as flores, as velas.

-x-x-x-

- A senhora nunca se sentiu traída?

- Não por meu filho.

- E seu marido, soube que ele foi assassinado. Nunca quis saber quem foi?

- Meu marido era escória, pagaria a seu assassino.

- E Julio. Como nasce um filho sem pai?

- Eu criei Antonio sem pai. Meu marido – que Deus o tenha e o castigue – morreu dias antes do parto. Às vezes a memória de um pai é melhor que o pai. É uma cruz em nossa família os pais morrerem antes de gozar dos filhos.

- Adianta perdoar um morto?

- Não. Se você culpava meu filho não volte atrás agora, perdoe um vivo, seu filho que é inocente, deixe ele amar o pai. Eles vão entrar, prepare-se.

Niscia respira fundo, reúne em si a energia para o que virá.

- Mande-os.

Joana sai ao que começam a entrar uma a uma das quatorze pessoas, entre amigos e familiares, que não se cansam de consolar.

- Sinto muito...
- Ele foi muito querido...
- Ajudaremos em tudo...
- Foi injusto, ninguém merecia...
- Não faz sentido mesmo...
- Foi para um lugar melhor...
- Minha santinha vai interceder por ele...
- Julio vai precisar da mãe mais que nunca...
- Sê forte que só assim passa...
- A memória dele fica, não esqueça...

- Obrigada...
- Sim...
- Grata...
- É verdade...
- Nunca faz sentido...
- Deus te ouça...
- Bondade tua...
- E eu dele...
- Tomara que passe...
- Não há como...

Quando o último se retira, Niscia se encontra novamente sozinha com o caixão inerte, impregnado de morte, espalhando sua essência na sala, nos crisântemos, nos mandacarus, nas velas, nas paredes, no chão, nas sombras, nas pessoas, nas almas e não sei mais em quê que não sai. Não sai.

- Antônio...

-x-x-x-

Gilete. Lacuna.

Niscia tira as luvas para barbear o corpo, suas unhas estão vermelhas, escandalosamente vermelhas; seus dedos desejam aquecer a pele fria, seus dedos desejam por si só, desejam percorrer o tórax, o abdômen.

As mãos deixam a gilete testemunhar tudo dum canto.

Niscia abandona seu luto sentindo seu corpo tão nu quanto o corpo de seu marido. Ela divide sua vida com Antonio na ilusão de que ele possa dividir sua morte com a esposa. Ela senta em cima de seu corpo morto, apalpa seu sexo, esfrega desesperadamente o dela contra o dele num instinto sem sentido, sem razão, instinto mesmo.

-x-x-x-

Quando pensa que todos acabaram a outra entra.

- Niscia...
- Não sei, eu só... Licença.

Niscia volta para o banheiro com os pensamentos tão cheios que nem a torneira aberta poderia silenciá-los, ela não sabe para onde vai, não sabe se trancou a porta, não sabe se está vestida.

Sente apenas inchaço, como se algo imenso a preenchesse, a inflamasse, algo que a toma de seus pensamentos, de suas atitudes, de seus sentidos, definitivo, congelante.

Quando dá por si não são lágrimas – É urina. Urina sem dar por isso, urina cada lágrima que não verteu de seu rosto, urina a morte do marido, urina culpa por sua intolerância. Está sentada no sanitário, nua, esvaziando cada gota de saudade em si enquanto rói o vermelho das unhas, enquanto tenta arrancar a cor de sua pele.

Rute entra no banheiro com seus sapatos vermelhos, tranca a porta, despe seu luto completamente e fica nua frente à Niscia, exceto pelos sapatos, que ela não tira.

- Suas unhas ficam lindas de vermelho.

- Obrigada. Qual seu nome?

- Rute. Não há mais ninguém com quem dividir esta ausência.

Um líquido esverdeado e quente escorre pelo azulejo do banheiro caindo do meio de um par de sapatos vermelhos, mortalmente vermelhos.

Quando o pranto de ambas acaba Rute se limpa e vai sentar no colo de Niscia, que a envolve e é envolvida. Consolo.

Frio de corpos nus, calor de corpos entrecortados, Antonio morto na sala, duas viúvas no banheiro, um filho e uma mãe sem lugar, a oração das beatas. As unhas e os sapatos vermelhos, mas tão vermelhos!

Batem à porta. Ambas vestem-se, Rute se esconde e Niscia sai. A noite afrouxa, é hora de levar o corpo.

Niscia acompanha quatro homens levantarem o caixão e iniciarem a marcha em direção ao cemitério.

As luvas de Niscia ficaram no banheiro.

Ao seu lado por todo o caminho Rute a acompanha, o salto do sapato de Rute roça na perna de Niscia, as unhas de Niscia roçam o braço de Rute.

Todos choram por onde sentem saudade.

sábado, 26 de julho de 2008

Rosas amarelas

Marcela entrou em casa com os olhos semi-cerrados. Com o cansaço do dia lhe ardendo no corpo, ela se movia ausente de si pela casa, mecânica do costume das coisas.
Lançou um olhar rápido para a cozinha: tinha almoçado? Talvez não. Não importava, não sentia fome havia muito tempo, e se tinha, o apetite lhe faltava. Limitou-se ao copo d’água corriqueiro, que teria deslizado mais refrescante garganta abaixo caso ela já não estivesse tão distante das pequenas felicidades do mundo.
Tinha tantas obrigações, tantas correrias, tantos importantes e urgentes que vivia fora de si, virtual, mecânica e prática. Um corpo jovem e condicionado.
Sobre a mesa da sala, no entanto, percebeu as flores.
Eram as suas rosas amarelas, as que comprava quase todo dia, por uma necessidade muda, para colocá-las ali, no jarro.
Mas as rosas sempre amanheciam murchas.
Mas era assim mesmo: quase todo dia era preciso trocá-las, elas não duravam. Faria isso amanhã cedo, antes de ir trabalhar.
E foi dormir, gasta que estava do dia. Do mês, do ano, dos tempos. Tempos tão corridos que ainda lembrou-se de lançar um olhar pesaroso sobre os papéis do trabalho.
Vinha pensando em ir ao médico, porque também não andava dormindo direito. Os olhos fechavam, a mente afrouxava... mas ela permanecia ligada. Se sentia como um computador, esgotado de tantas informações vazando. E não podia desligar. Passava a noite consciente de que estava dormindo um sono agoniado, meio descanso, meio cansaço. Acordava de um salto: amanheceu! E saía saltando pela casa, fugindo do atraso que nunca tivera, e que, por isso mesmo, tanto temia. É que tinha um medo toda vez que olhava para o relógio: horas, minutos e segundos, vazando loucamente, escorrendo por ela, pelas coisas. E então corria junto, para não vazar também e perder o compasso.
Naquele novo dia, que acabara de estrear, não foi diferente: na hora marcada entre o relógio e o seu corpo ela pulou da cama, e saiu apressada pela casa, revisando na cabeça o de ontem e o de hoje.
E as rosas murchas! — era preciso correr em dobro, que ainda tinha a floricultura para passar.
Correu o triplo, para garantir.
Era o jeito das coisas na vida.
E saiu de casa com a certeza consoladora de que as rosas resplandeciam sobre a mesa, jovens e formosas. Como ela não tinha mais tempo de estar.
Horas depois, chegou em casa, no momento certo, marcado.
Fechou os olhos e inspirou fundo: que dia!
E, repentinamente, calma..., um bem-estar, um prazer tão sem propósito lhe invadiu o peito! Ainda abriu os olhos a tempo de ver as rosas brilharem, sobre a mesa.
Mas aquele era um instante eternamente perdido.
Pronto. Já tinha lhe escorrido pelo corpo, já não existia mais. O ar já era denso, pesado duma agonia tão grande, tão forte.
Foi dormir seu sono sofrido de todos os dias. As rosas, sobre a mesa, no entanto, morriam silenciosamente. Envenenadas.

quarta-feira, 23 de julho de 2008

tem alguém aí?
tem alguém aí?

sexta-feira, 11 de julho de 2008

o homem que lia o jornal de ontem

Quem passasse na Rua da Soledade, na frente da casa 53 pela manhã, com certeza viria dois jornais jogados no tapete da frente. Josefim tinha uns 30 anos, apesar dos cabelos grisalhos.Não saia de casa nem para comprar comida: mensalmente vinha um entregador com uma pequena sacola e deixava na frente de sua casa as comidas de necessidade básica, e por um buraquinho na porta ele passava as mãos magras com o dinheiro. Era de poucas palavras e considerado um 'louco-esquesito' pela vizinhança.

Sua fama vinha pela fato de sempre ler os jornais do dia anterior, passando a noite toda concentrado naquelas notícias deliciosamente atrasadas. Em uma de suas aparições pela rua para apanhar o jornal que o " pirralho-jornaleiro" havia posto longe de seu portão, um garoto lhe abordou:
- Seu Josefim, por que o senhor ler sempre o jornal de ontem?

- Por que você ler o jornal do dia?

- Pra saber as notícias do dia.

- Eu leio o jornal de ontem para saber as notícias de ontem, ora pois!


E entrava sem mais conversa. A cada dia a vizinhança se intrigava mais com os seus mistérios. Ele não tinha telefone, tv ou rádio! Seu único meio de comunicação era o tal jornal ultrapassado. Ele acreditava que as notícias velhas eram mais atraentes, pois podia rir delas, chorar delas ou até mesmo xingá-las e depois ler todas as desgraças, ir dormir tranqüilo. Afinal, as notícias já haviam passado e nada pudia se fazer para mudar. E assim passava seus dias sozinhos ansiando o jornal para pegá-lo um dia depois.

Certa vez, viu no jornal uma notícia de um homem que lia jornais. Surpresa. Ele havia morrido segundo a notícia. Com letras grandes e vermelhas o jornal falava de seu assassinato, quando fora pegar o jornal havia sido abordado por um moleque ladrão e morto pelo mesmo. Inquietou-se.

Sentado em sua poltrona de sempre, pensava no acontecido. Ele havia morrido? Como nunca havia percebido? A vida as vezes nos prega peças e em pleno dia se morre. O jornal caiu de sua mão.Levantou-se, foi até a janela, riu de sua própria vida, uma gargalhada leve de descanço. Foi até o guarda-roupa e pegou a arma, sentou-se na poltrona. A luz vermelha do pôr-do-sol o tentava, lhe mostrando o que fazer. E aos poucos o jornal de ontem no chão era tomado por um líquido da mesma cor do céu, o céu que trazia notícias novas.

sábado, 5 de julho de 2008

Contra a correnteza

Não sei ao certo como se conheceram, mas lembro-me bem daquele dia.

Ela o viu ali sentado, sozinho. Pousou ao seu lado, sem o menor ruído. Pôs-se a observar. Desenhava coisas que ela não conseguia entender, mas também não perguntava. Apenas observava.

Ele gostava daqueles olhos verdes, atentos, a tentar decifrar o que talvez só os dele conseguissem ver.

~~
Complexo demais.

Que nada.
Tão simples que ninguém conseguia enxergar.

~~

Não suportava quando lhe perguntavam: "O que você quis dizer com este desenho?"
Ora pois!
Não quizera dizer, estava dito!
Cabia ao leitor interpretar.
Mas isso não vem ao caso. Voltemos aos olhos verdes.

Sem dizer palavra alguma, conversaram por horas. Aquele olhar ficaria na mente por muito tempo. Parecia entender seu desespero, sua dor. E estaria sempre lá, para ouvir, acalmar, confortar.

Ele sentia algo diferente. Um gosto, um cheiro, um sei lá o que. Era estranho e bom. Como um arrepio, daqueles que se sente quando se está em perigo, ou quando o carro desce de vez o viaduto. E era constante. Durava tanto quanto os verdes ímãs atraíssem os seus olhos.

~~
Tinha olhos de metal.
~~

Ficou agarrado àquela visão, como nunca acontecera antes. Aquilo era muito forte e parecia capaz de destruir qualquer coisa que pudesse impedir sua existência.

~~
Sonhou.
E não foram os lábios o que desejou.
Tampouco os seios, as coxas.

Queria aqueles olhos,
Aquele convite a um universo até então desconhecido.
~~

É uma pena não ter passado de um sonho.
Sabia que acordaria, então simplesmente sonhou um pouco mais.
E mais.

Mas era hora de partir.
As pernas pareciam não concordar, mas ela precisava ir.
E tão silenciosa quanto ao chegar, se foi.

~~
Sua pequena utopia nunca deixou de o ser.

E a alimentava a cada encontro.
Um forte laço mantinha viva essa vontade.
Apenas a vontade. Tornar real estragaria a brincadeira.
~~


A Escolha

Sou impróprio para tudo.
O que serei da vida?
Respondam-me!
- se só posso responder -

A escolha desde agora me persegue
Devo decidir.
a Existência
despenca disso.

Tudo é impróprio.
Se é prazeroso,
não me vale a pena.
Se é valoroso
não me agrada.

Mundo cruel,
capitalismo podre,
- e pobres são meus poemas -
Sou jovem,
as rédias da existência
já me são concedidas.

Mas que tristeza infinda,
que dor melâncolica,
esta sociedade sem rumo...

O que farei?
A academia é meu destino?
Afirma o coração.
O tesouro está nas máquinas que dizem?
Acusam os neurônios.
Entre razões, emoções
em que confiar?

A eminência da escolha me atormenta,
sinto medo de perder vida.
- quero consolo de alguém... -
Quem será meu conselheiro?
Se habilitam vários...

Mas a calma chegará,
Entendo, falta tempo.
E a escolha?
o senhor milenar mostrará...

segunda-feira, 30 de junho de 2008

É assim mesmo

É mais ou menos nessas condições: o roteiro nunca é criado, mas está sempre sendo escrito, surge quando o espermatozóide entra no óvulo. A partir desse momento o que vai nascer não é escolha da pessoa, pelo menos no mundo que Deus criou.
A direção é o médico, Deus, o paciente - e os outros - que dão; a produção é o que faz o bebê se desenvolver - todos os cuidados dos diretores e outros mais - a mãe, e o Beetovenn que o pretenso ser escuta – o pai também ajuda às vezes, dependendo de sua erudição e amor.
Na hora do parto começa a edição, que só termina no último suspiro. Uma edição mal feita pode trazer graves problemas para si mesmo e para os outros, se for precoce ou tardia pode prejudicar todo o desenvolvimento do ser. Alguns nem ligam pra essa edição, fazem-na inconscientemente, outros não a realizam por efeito do medo ou da raiva, e existem ainda os que por muito pensar acabam por se esquecer de auto-editar-se diariamente. Em meio a tudo isso o novo ser recebe críticas e aplausos, e vai assim, entre tropeços e andanças, criando sua única, própria e extraordinária identidade.
Adaptado
- fizeram de um jeito seu e eu coloquei do meu -
perdoem os deslizes e esquecimentos!

terça-feira, 24 de junho de 2008

descobertas de domingo

Eu estava almoçando na casa de uma amiga e por um motivo que nem mesmo a gente entendeu chegamos em uma conversa que disparei: " é que toda casa tem uma porta que só o dono consegue abrir, com aquele macetezinho. " E assim paramos. Pensamos. Olhamos. Engraçado como pequenas coisas nos unem. Por mais estranhas, diferentes, ridículas e odiavéis que as pessoas possam ser. Por mais que uma adore andar descalça, chuva fina, suco de maracujá com leite e morem mais de um Atlântico de distância. Mesmo que seja rock, punk, harecrisna, homo, bi, espanhola, africana: sempre teremos uma coisa só nossa que ninguém conseguirá desvendar e justamente isso será o nosso elo invisível de união, a nossa semelhança. Assim não importa o que somos ou o que escolhemos ser, somos sempre um, somos sempre todos, somos sempre singular. Como a porta da nossa casa, que só nós sabemos o jeito de abrir.

segunda-feira, 9 de junho de 2008

Disposições

Ela era alta, esguia e impertinente. Ele quase não a aturava. E se digo quase é porque ela ainda era alta e esguia. Arrisco bonita. Arrisco bem bonita. E nem assim ele a aturava um pouco mais.
Era uma quota: ela era alta, esguia e bem bonita, e ele a aturava até ali. De resto, ela não lhe aparecesse falando aquelas coisas dela, que ele não tinha paciência! Por isso o quase de antes.
Bem, eu já disse que ela era impertinente. E era mesmo. Tinha uns jeitos, uns olhares, umas conversas... e ele sempre olhando de lado: ninguém agüenta isso, meu deus! E ela lá. Impertinente do mesmo jeito.

Um dia ele disse: eu não lhe agüento!

Ela era impertinente: é claro que ficou por isso mesmo.
Ou melhor, não ficou. Ela já sabia que ele não a agüentava. E por isso mesmo que ainda estava por ali: era alta e esguia, podia se dar àquele luxo. Além do mais, tinha seus prazeres maliciosos e suas vaidades: sabia até onde ele a aturava, então puxava a corda.
Ele se achava um tolo. Um idiota? Antes um estúpido. Estúpido aturando ela. Ou não a aturando. Dá no mesmo. Continuava sendo estúpido: ela continuava ali.
E ela adorava secretamente, ou nem tão secretamente assim, quando ele curvava uma ruga no rosto: eu não lhe agüento! Um dia ela arriscou dar uma risada. Ele ficou vermelho, vermelho e... ah!, era um estúpido. E ela era impertinente.
Se ela gostava, um pouquinho que fosse, dele, ninguém sabe. Ou pelo menos eu que não sei. Pra você dá no mesmo. O que eu sei, o que se sabe, é que ela gostava muito de si mesma: era impertinente, alta e esguia. Deus deu o pão a quem tinha dentes. Ficava sendo justo.
Ele podia não gostar dela de verdade, mas gostava de conveniências. Então ficava gostando dela até onde ela era adequada.
E ela sabendo daquilo ria-se, ria-se muito. Que ele ficasse vermelho, mais um triunfo para ela colecionar.
E nisso gastaram não sei quanto tempo. Arrisco muito.
Mas um dia ela quis ser menos impertinente. Porque, não me perguntem. Vai ver acordou com os olhos na lua e pensou: amanhã eu quero ser alta, esguia e agradável, quem sabe. Eu não sei.
O fato é que, dessa vez, ela não sabia o como da coisa. Olhava para ele, se a ruga aparecia não olhava mais. Falava com ele, se a ruga aparecesse não falava mais. Tentava e acabava dando trégua. Até que se convenceu: a ruga não aparecia quando ela era só alta e esguia. Ah, e bonita.
Mas não bastava! – para ela, é claro. Ficava faltando alguma coisa. E ainda podia tentar a impertinência, se não tivesse acordado com os olhos na lua.
Ele ficou pensando: está mais impertinente que o normal! Ah, que ninguém agüenta isso!
Ela era adivinha. Adivinhou que com ele não conseguia nada além daquilo.

E foi embora.

Dizem que ele sente saudades. Acho que sim.

domingo, 1 de junho de 2008

Ensaio sobre o amor

" Nós amamos a idéia de amar alguém, o que é inatingível.Quando não conseguimos, desistimos e seguimos em frente."

Em geral dividem o amor em três: amor eros [ carnal ], amor filia [mãe e filho, irmãos, amigos] e amor fati. [ amor ao destino].Pra mim é um erro confundir amor e paixão. Amor eros é paixão, e tem fim: logo não é amor. Quando você diz " eu te amo". Você não está mentindo. Você sente amor por aquela pessoa e diz isso para que ela saiba. Assim, provavelmente, ela ficará perto de você e saberá o quão é estimada. Você a trata bem, para ela ficar bem e conseqüentemente, você também se sente bem, feliz. Pouto tempo depois o amor parece ser maior. O amor cresceu? Amadureceu? O amor está dividido em níveis? Era realmente amor o que você sentia quando disse da primeira vez? O que é amor?

" Sair de si por três minutos, isso é amor" (Cazuza)
A melhor definição que já vi. É sentir algo tão esplêndido e efêmero que chega a ser irreal. A ponto de você se perguntar se está realmente ali, se realmente aquela pessoa é tua e como você pode sentir tal imensidão. O amor é a descoberta e não palavras. é você se descobrir a cada dia por aquela pessoa. Por mais que você fale com a pessoa ela sempre tem algo pra lhe contar e te surpreender. "O bom de conhecer pessoas é que um dia ela pode te apresentar a você mesmo" (trecho do filme waking life).

Atingir o inatingível, incessantemente, infinitamente. Isso explica por que a amizade dura, por que o laço entre mãe e filho é tão forte, e por que existem casais que se conhecem e morrem juntos. O amor é eterno.

sábado, 31 de maio de 2008

E passaram-se os dias sem conta, infindáveis em meio à guerra. Vidas e vidas esvaíam-se, como areia morna que nos passa por entre os dedos; e eram devoradas pela poeira morta do deserto.

sábado, 24 de maio de 2008

Presença...

Você pode chorar em meu ombro
Se proteger em meu abraço
Jogar suas lágrimas em minhas mãos
E correr com minha presença

Pode fugir em minhas palavras
Brincar com meus beijos
Pular nossas brigas
Segurar minhas mãos sem medo

Pode ligar para meus pensamentos
Castigar meu orgulho
Se cobrir com meu amor
E gritar os meus erros

Pode fazer o que quiser
Mas não esqueça, continuo com tudo
Ouvidos, mãos, ombros, voz e coração
Você só tem que me mostrar que ainda vai precisar.

Te amo.

s2

sábado, 17 de maio de 2008

O bom de conhecer pessoas novas é que elas não sabem dos nossos defeitos. O bom de preservar as antigas, é que mesmo com defeitos, elas se prendem em nossas qualidades. O bom de terminar amizades, é saber que tudo um dia acaba, e nos dá noção de realidade. Ao saber que nem tudo que achamos é. O bom de ter inimigos é que eles só vêem nossos defeitos, e se vêem nossas qualidades, as transformam em defeitos. Sendo assim é realmente bom ter inimigos? Tudo depende do ponto de vista.

No final das contas, o bom mesmo é ser humano e acima de tudo ser. Não pegar idéias dos outros, afinal de contas: se você sempre não for você, quando descobrirem quem é você, não passará de ninguém.

terça-feira, 13 de maio de 2008

Certeza? Ah! Qual é! Não vem com essa pra cima de mim! Afirmar com toda convicção é impossível... Como você ou qualquer outra pessoa tem coragem de me dizer coisas para me convencer de que estou errada? Para me confundir e não deixar as coitadas das minhas idéias e escolhas quietas e comportadas? tá, tá... Já entendi: se eu fechar meus olhos e tapar os ouvidos, você fica calado... Agora me responde uma coisa seu coração irracional: por que diabos você não passa uma fita crepe na boca?

quinta-feira, 8 de maio de 2008

sorriso amarelo.






" Eu não devo nada o dia, nem o dia deve a mim."


e pra sair do clichê, presa em mim. Foi o pior dos erros: reduzir-me a mim mesma.

Deve ter sido aquele capuccino...

instante-já

vai ser. tá sendo. é. era. passou.

segunda-feira, 5 de maio de 2008

O extraordinário de cada dia

Hoje eu senti tanto. Me senti tão mais-um. E fiquei tão triste. Porque eu descobri que meu amor não foi tão forte a ponto de ser transmitido além de mim. Eu fico feliz por 10 minutos, logo em seguida sinto uma angústia-felicidade que não se exprime em palavras. Sentir é tão humano, tão efêmero, que não sabemos o que é sentir quando não sentimos. E eu sinto tanto. Como um adulto?

domingo, 27 de abril de 2008

metafísica do fim de semana

Enquanto a luz da luminária
refletia nos olhos gris,
As palavras soavam caladas
sobrando uma melodia assim:

" O nada é uma palavra
esperando tradução"
E soava como um vício
difícil para a audição

A Coca-cola zero era uma pista:
zero o nada era
e sairia sem ser vista.

As risadas eram vazias
e de nada se preenchia
Mas se nada é tudo
o mundo é um absurdo
surdo e sem estradas

pois uma palavra esperando tradução:
é nada.

quarta-feira, 23 de abril de 2008

Ela negava tudo.

Ela negava o nada. Negava até sua imagem ao espelho, e pra viver, se pintava. Sendo outra pessoa seria mais fácil do que ser ela mesma. A maquiagem era como uma máscara, e lhe protegia das pessoas incompreensivas. Ela era uma pessoa que não se compreendia, e sendo assim, era o não. Procurava o desconhecido. Tentava se encaixar no que ela dizia abstrato. Gostaria de viver não como uma pessoa comum, queria atingir o inatingível. E partia ela, para o infinito de seu infinito. Às vezes se perdia por lá e ficava no escuro por longos dias. Na sua compreensão ela se achava. Se achava na razão; logo enjoava e voltava para outro caminho, o sentimento não-compartilhado.

Mas, se pintava. E ficava diante do espelho tentando se achar. Quando não conseguia achar alma, se despedaçava. Não havia sentido a vida. Era uma viagem pra lugar nenhum. Negava o não. Mesmo em descompasso, ela andava. Caía, se levantava. E nessa dança ela queria atingir a perfeição. Conhecia os passos da dança, não conseguia executá-los. E como uma bailarina que dança num palco escuro, ela se apagava do mundo.

quarta-feira, 16 de abril de 2008

- Boa tarde,

onde eu posso fazer minha identidade?

- Naquele galpão ali fora!

Várias cadeiras simetricamente postas, pessoas e TV. No balcão, duas mulheres fardadas organizavam o fato sem destoar do local. Viu minha certidão de nascimento e minhas fotos:

- Pegue uma ficha e aguarde. Meu número foi 8. Havia vários cartazes em " AVISO AO USUÁRIO"e "SEGUNDO O CÓDIGO PENAL". Todos aparentemente pacientes procuravam algo pra fazer. Poucos conversavam e por alguma coincidência estranha a maioria usava roupa amarela, eu destoava.


Um homem chegou e pediu para que os seguíssemos. Foram uma seção de corredores que passavam por espaços com outras mais pessoas a espero de algo que não sei. Em fila, fomos chamados pelo número da ficha e sentamos em cadeiras congregadas, tão perto: que o mais próximo lia claramente o meu caderno enquanto eu escrevia esta crônica. No menor mexer as cadeiras rangiam, o que nos fazia ficar o mais quieto possível para não ouvir o som irritante.


Depois de algum tempo passaram alguns por nós, se dirigindo a outra sala. Alguns tranquilos,
nervosos, inquietos, porém todos prontos para o incerto. Perguntaram meus dados e assinei uns três papéis incluindo termo de responsabilidade. Fui direcionada a outra sala de espera. O tec tec do computador e as vozes das pessoas que trabalhavam no local era ensurdecedor, se as cadeiras rangessem não seriam escutadas, por isso na sua insignificância elas se calaram.

cansei da cor/foto/cara desse blog.

sábado, 12 de abril de 2008

La lirlo de la lili'

Lirlas la lili'
En ombro de l' nokt'
Mallumas la glaci'
Kaj vekiĝas milda mort'

quarta-feira, 26 de março de 2008

Canto do Xangô.

Mas amar é sofrer
mas amar é morrer
de
dor.

Xangô, meu senhor. Saravá!
Ah, me faça morrer
mas me faça morrer
de
amar...

Save Xangô: my king, my lord
Save my Orixás
There are seven colors of love
Seven days to you cry...

quinta-feira, 20 de março de 2008

O tempo passa.


Os humanos correm. As pessoas esquecem. As pessoas me esquecem. Quando a gente se encontrar na rua e eu puxar um assunto, mesmo que não lembre do meu rosto ou nome, converse como se fôssemos irmãos, que não precisam de nomes para se chamarem.


Ria dos velhos tempos esquecidos, entristeça com a notícia de que um dos nossos se foi. Das puladas do muro. Da nossa banda preferida. Das tardes pensativas. Das manhãs silenciosas. Das cartas nunca mandadas. Da palavra não dita.


Há certos momentos que não é preciso dizer o quanto se ama alguém. Está tão implícito, tão à mostra, é tão intenso em tudo que foi vivido... mas como eu queria ter dito! E nos arrependiríamos... o assunto acabaria. Constrangimento. Você se perguntaria como ter tanta intimidade e não se lembrar de mim. Seria Renan, Vítor ou Felipe? Não importava...


A despedida foi com aquele "vamos-marcar-pra-se-ver-de-novo" " vou-te-ligar!". Onde nós dois saberíamos que não iriamos nos ver mais. Deixe me pensar que você, provavelmente, nem havia lembrado do meu nome. Mas não confirme. Nesse caso, a dúvida é uma confortante felicidade.


- Quem é aquele homem?


- Não sei, achei que o conhecia e puxei assunto...

- E você o conhecia?


- Acho que não...


quinta-feira, 28 de fevereiro de 2008

Nuvens

Você já parou para pensar como era bom ser uma criança pequena e ter como única preocupação tentar decifrar que desenhos as nuvens fazem no céu?

Que tempo feliz aquele quando não era preciso se preocupar em seguir ou não as regras de uma sociedade, ou em estar dentro ou fora da mesma, quando sempre se encontrava tempo para tudo, pois ele nunca parecia faltar, quando não se pensava no que fazer do passado e no que foi feito do futuro, pois essas eram coisas que não pareciam nem mesmo existir.

É, mas quando se cresce só mais um pouco, vêm todas as preocupações de uma só vez... Alguns só pensam em que carreira seguir, passar no vestibular, fazer cursinhos, se matar de estudar... "Paremos de viver, pois o vestibular vem aí" é o que alguns parecem dizer. Outros já se preocupam em conseguir um emprego, ganhar dinheiro, sair de casa, ter a própria vida e não depender mais de ninguém... Mal sabem esses que nós, seres ditos humanos, dependemos uns dos outros, ainda que não percebamos. Há ainda aqueles que se preocupam com os rumos do mundo, com o que acontece na política, na economia e nas artes, com aquecimento global, fome e desnutrição, mas nunca conseguem achar uma solução para todos esses problemas, e parecem estar sempre frustrados. Isso sem contar com aqueles que simplesmente se preocupam com tudo isso junto, criando uma verdadeira tormenta de idéias e pensamentos nas próprias mentes, o que termina por levar muitas destas a um colapso.

Agora, o mais interessante, é que quando nós, pessoas, vamos chegando ou passando pela adolescência, mocidade, juventude, fase adulta, enfim, quando não somos mais tão crianças e é preciso classificar a nós mesmos com outra nomenclatura, parecemos simplesmente esquecer de parar um pouco e relaxar a mente de todas essas preocupações. Então, bem, tentemos nunca esqueçer de como é bom olhar para cima, ainda que apenas por alguns instantes, e se preocupar apenas em decifrar o que as nuvens estão desenhando no céu.

sábado, 23 de fevereiro de 2008

Ser adolescente é difícil?


Com as clonagens, células-tronco, papa criticando livros de fantasia, avanço tecnológico com máquinas que quase pensam por nós ( pelo menos, eu acho que ainda temos o nosso próprio pensamento... ), mães tendo 7 filhos de uma só vez, os mensalões e cuecões da política e times de futebol não subindo para a primeira divisão, me vem uma dessa no meio da aula de português:

- Façam uma crônica com o seguinte tema: Ser adolescente é difícil?

Meu Deus! Como se já não bastassem a prova de história onde temos que resumir 5 capítulos em 30 linhas; as hipotenusas, paralelas e tangentes malucas de desenho geométrico onde o professor faz questão de ensinar mais do que podemos absorver; os teoremas de Pitágoras que nunca vou usar na vida; as aulas de artes que temos que desenhar o jarro perfeito, a sombra perfeita, no ângulo perfeito para tirarmos A ( pra quê isso se quero ser jornalista? ) e agora essa: Ser adolescente é difícil?

Você querendo ir pra uma festa, mas tendo que ficar fazendo trabalho. Receber reclamação do pai por que você justamente queria estudar : " Mas pai, eu só pulei o muro da quadra para falar com a professora que a aula da turma dela já havia acabado e agora era a nossa aula de Ed. Física! " Dormir mal pensando nas provas. Gastar nossas cordas vocais gritando com alguns amigos do seu grupo que pela 5ª vez adiaram a reunião para fazer o trabalho. Perder o seu programa preferido da TV só por que ele passa tarde e você tem que ir dormir cedo, pois tem aula no ouro dia. E ainda faltar a aula de revisão por causa de míseros segundos que o maldito ônibus atrasou e o professor não deixou você entrar.

Não, você tem que sofrer isso. Mesmo você podendo estar numa praia curtindo a arte de fazer nada e dormir a hora que quiser com o único compromisso no outro dia sendo uma festa que começa às 18h sem hora pra acabar. Tomando sorvete adoidado sem se preocupar de pegar uma gripe e ter prova no outro dia. E ainda vem me perguntar isso? Então NÃO. Não é difícil ser adolescente. Difícil é ser: ESTUDANTE!

08/02/06 - 7ª série

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hahaha, encontrei isso aqui em uma das faxinas! :)

quarta-feira, 13 de fevereiro de 2008

(des)esperando o esperado.





Era aquela trizteza cinza. Sem choro, sem conforto, mas não vazia. O rosto tranquilo mostrava a confusão que estava passando. Era uma tristeza tão profunda que as lágrimas (des)necessárias nem insistiam em aparecer no espetáculo. Olhos pretos. Inerte. Respiração calma. Nariz vermelho. De vez em quando puxava o ar com força: talvez pra ter certeza de que estava vivo, talvez por querer morrer dando seu último suspiro. A boca apesar de entre aberta não emitia som: o silêncio dizia tudo.

As pessoas eram marionetes onde as cordas que as cordenavam era o sangue em suas veias. A platéia era tão fétida quanto o cheiro do sangue grangrenando no seu pensamento.
Engraçado como a palavra desespero pode representar coisas diferentes. Des espero, não esperar nada. Desespero , pânico, agonia. No entanto, ele sentia os dois, permanecendo com seu rosto quase que rindo de si mesmo. A sua corda viva havia sido cortada e ele não entendia por que não havia morrido. A cor da vida era invisível e ele não fazia parte desse mundo, nem do outro. A cor ação nada fazia e ele ficava obedecendo o nada, quieto, mudo, cego. Os sonhos são reais enquanto duram, não poderíamos falar o mesmo sobre a vida?

Há certas situações que se surpreendemos com nós
mesmo. Seria o fim, o meio ou recomeço? Não importava. Virou de lado e foi dormir. Teve até sonhos.





Desenho by Pancreas

quinta-feira, 31 de janeiro de 2008

stop.

o mundo parou ou foi o automóvel?
( Andrade, Carlos Drummond )

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férias papai! :D

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Etou bem assim esses dias, down sem saber por quê. Nem me entendia, até hoje. A despedida de Ricardo, o cara vai pra minas gerais véi, QUE PUTO! :~ 5 ANOS DE ETERNIDADE.

" Mesmo que o tempo e distancia digam não. Mesmo esquecendo a canção: o que importa é ouvir a voz que vem do coração"

e o coração diz em choro: és inesquecível Rick. :~

domingo, 20 de janeiro de 2008

clareia

No tom da voz que ecoa
Foi desmarcada aquela paixão
A borracha esfregou a pele, pêlo
Tanto custou pra sumir
Quanto sangrou pra gravar
E se o que permanece liso por fora
É rasgado por dentro,
De que adianta as flores estarem
Cada vez mais murchas e esbranquiçadas
Enraizou.

terça-feira, 15 de janeiro de 2008

Ela gostava das palavras.

Quando triste se trancava no quarto e se punha a escrever. Nem pensava muito. As palavras comandavam seus dedos. E ela gostava disso. Alguém a entendia. Certa vez a disseram que toda criatura viva, morre sozinha. Susto. Correu pra se esconder em seu refúgio. E chorou. Não queria ficar só. Seu caderno entre os braços ela abraçava fortemente. Ficou em paz. O abriu e leu tranquilamente: ali era seu mundo. Ela podia tudo. Voar, tomar sorvete invés de sopa na hora do jantar. O passarinho falou: estou grávido do mar. E pariu um rio. Ela riu. Sabia que aquilo era verdade.


Gostava de acordar cedo. Não para ver o sol nascer e sim para ver as nuvens. Elas estavam brancas, depois o céu esbranquiçava e as nuvens ficavam cinzas. O céu avermelhava. As nuvens rosavam. O céu ficava azul, e as nuvens brancas. E lá se ia o espetáculo com a espectadora fiel. Ela acreditava que assim era o ser humano, mudava de formas mas sempre ficava a essência. A evolução era vida.


Dizem que no leito de sua morte estava toda a família ao seu redor. Ela na cama inerte com a doença que a consumia. " Me deixem levantar..." Arrastando-se foi até o quintal onde ficava observando o céu. Se despediu, fechou os olhos, colocou a mão na barriga: estava grávida de uma flor. Ao redor do seu túmulo, nasceu um jardim.